Uma audiência pública realizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta segunda, 17, discutiu a exigência de chamamento público para o funcionamento de novos cursos de Medicina, conforme previsto na Lei do Mais Médicos (12.871/13).
O tema da sessão é objeto da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 81, protocolada pela Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), e da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7187, protocolada pelo Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (Crub).
Ambas têm como relator o ministro Gilmar Mendes, que realizou a sessão para coletar “subsídios técnicos e fáticos” que devem embasar a decisão do Supremo.
Em 2018, uma portaria do Ministério da Educação (MEC) suspendeu por cinco anos a abertura de novos cursos e vagas. Desde então, quase 100 liminares, autorizando o funcionamento de novos cursos, foram concedidas.
A Anup defende o chamamento público como um dos critérios para assegurar a qualidade na formação de novos médicos, sobretudo em instituições que ofereçam uma estrutura que permita a realização de aulas práticas.
“Se não há campo de prática, se não há estrutura pública, nós não podemos ter entrada de novos cursos. Isso é requisito de qualidade, e qualidade é a única coisa que pretendemos obter aqui quando pedimos uma liminar”, disse Elizabeth Guedes, presidente da entidade, a primeira participante da audiência pública a se manifestar
Elizabeth afirmou, ainda, que o intuito da ADC 81, ao defender a exigência do chamamento público, é estabelecer segurança institucional. “Pensar que uma lei pode, simplesmente, ser destruída; que uma política de estado pode ser negada é oferecer uma insegurança jurídica que não gostaríamos de ter no setor”, completou a presidente da Anup.
PREJUÍZOS
Além dela, também se manifestaram como representantes da Anup o Dr. Milton de Arruda Martins, professor da Faculdade de Medicina da USP, e a Dra. Patrícia Tempski, coordenadora do Centro de Desenvolvimento de Educação Médica da Faculdade de Medicina da USP.
Para Milton, a abertura de novos cursos de Medicina e de novas vagas podem resultar em prejuízos na formação dos médicos. “Não há a necessidade de novos cursos de Medicina no Brasil. Entre os 20 países com maior população, o Brasil já tinha, em 2017, a maior relação entre cursos de Medicina e população”, argumentou.
Para Patrícia, mais vagas não implicam, necessariamente, em uma maior cobertura de atendimento médico, pois muitas localidades continuariam sem os profissionais – que acabam migrando das cidades onde estudam para os grandes centros. “As populações vulneráveis continuam desassistidas. Antes da discussão da quantidade, é preciso discutir a qualidade. O mau médico onera o sistema e coloca em risco o paciente”, afirmou.
DISTRIBUIÇÃO
Também presentes na audiência, os ministros da Educação, Victor Godoy, e da Saúde, Marcelo Queiroga, defenderam o chamamento público para a abertura de novos cursos de Medicina.
Victor disse acreditar que esse mecanismo é imprescindível para descentralizar a formação em Medicina, levando os cursos das capitais para o interior. “Entendemos fundamental a política de chamamento público, com políticas públicas efetivas de distribuição de médicos em localidades de maior carência”, defendeu.
Marcelo, por sua vez, diz que os critérios estabelecidos pela Lei do Mais Médicos permite avaliar a qualidade da formação. “O problema não vai se resolver com a abertura de vagas por meio de decisões judiciais. Nós vamos resolver isso qualificando as escolas que temos. Essa audiência é uma oportunidade extraordinária para que consigamos novos rumos para formar os médicos que nosso Brasil precisa”, pontuou o ministro.
Bruno Bianco Leal, advogado-geral da União, também mencionou a insegurança jurídica que o excesso de liminares provoca ao setor de Educação Superior. Para ele, o estado pode estabelecer medidas que restrinjam novos cursos com o intuito de preservar a qualidade da formação dos profissionais. “O risco é formarmos médicos que não tenham plenas condições de fazer frente aos desafios que serão, diuturnamente, submetidos”, frisou.
De acordo com o ministro Gilmar Mendes, a audiência pública observará quatro aspectos: a oferta de médicos no Brasil, sua evolução e distribuição no território nacional; os recursos essenciais para o funcionamento adequado de cursos de graduação em medicina; o impacto da política pública estruturada pelo artigo 3° da Lei 12.871/2013, especialmente do requisito prévio do chamamento público na distribuição regional de médicos e na formação médica brasileira; a dinâmica do mercado de cursos de graduação em medicina, bem como sua estrutura concorrencial e barreiras à entrada e, por fim, a atuação da Advocacia-Geral da União (AGU) no enfrentamento de decisões liminares, em sentido amplo, na matéria em questão