Após um ano e meio no ensino remoto, grande parte dos alunos e das redes de ensino pelo País retomou as aulas presenciais pela primeira vez. O avanço da vacinação e a melhora nos indicadores da covid-19 impulsionam o retorno à escola.
Além dos protocolos sanitários, o desafio de colégios e gestores será lidar com classes ainda mais heterogêneas, formadas tanto por alunos que tiveram suporte para aprender quanto por aqueles que passaram longe dos cadernos. E acolher todos os estudantes.
Dez Estados e o Distrito Federal mantiveram as aulas em escolas estaduais apenas no modelo remoto desde o início da quarentena, em março do ano passado – e só agora, no segundo semestre, autorizaram o retorno à sala de aula. Mesmo em regiões onde o retorno já estava autorizado e as escolas foram abertas, parte das famílias decidiu mandar filhos para o colégio só no segundo semestre.
Em Mato Grosso do Sul, a professora Luzimar Fai, há 20 anos na rede estadual, teve um desafio inédito ontem: evitar abraços dos alunos, trocas de lanches e a aproximação das carteiras.
A rede voltou após um ano e meio de aulas online. “Acredito que ter menos alunos facilita o controle, mas é um receio.” Boa parte das redes de ensino, como a de Mato Grosso do Sul, limitou o número de alunos nas escolas. No Pará, que também reabriu escolas estaduais pela primeira vez ontem desde o início da quarentena, o porcentual máximo de estudantes nas unidades era de 25%. A Bahia autorizou a ocupação de 50% das salas no segundo semestre, mas a frequência, tanto de alunos quanto de professores, tem sido baixa.
Em São Paulo, apesar de o governo ter autorizado a volta para todos os alunos, parte das escolas estaduais manteve o revezamento de estudantes ontem.
A rede estadual paulista já havia retomado as aulas presenciais no primeiro semestre, mas com baixa ocupação. Na Escola Estadual Djalma Ottaviano, em Campinas, no interior, os alunos eram aplaudidos por funcionários e professores à medida que entravam na unidade.
Para vários estudantes paulistanos, esta segunda-feira foi o primeiro dia de aulas presenciais desde o início da quarentena.
Nicole, de 12 anos, não conhecia os professores que ela via pelas telas e sentia falta dos colegas. Os pais decidiram autorizar o retorno presencial da menina ao Colégio Porto Seguro, na zona sul, após terem se vacinado.
“Foi um ano e meio longe da escola e agora finalmente chegou o dia”, conta o pai, o engenheiro Thomas Martin Diepenbruck, de 49 anos.
Isabella Calil, de 13 anos, chegou a ir uma única vez ao colégio em outubro, mas não se sentiu confortável e resolveu esperar a vacinação dos pais. Voltou ontem às carteiras do Pentágono, uma escola particular na zona oeste de São Paulo. Durante o ensino remoto, o rendimento caiu e algumas lições ficaram para trás. “Faltava rotina de acordar, tomar banho, colocar uniforme.” Para Isabella, será preciso alinhar os conhecimentos entre os colegas na sala, antes de avançar na aprendizagem. “Tem gente que está chegando agora e está bem confusa.” No primeiro dia de aulas, os professores começaram os trabalhos investigando o que os estudantes lembravam do que foi visto no primeiro semestre.
Diferentes
Ainda restam dúvidas sobre o tamanho do impacto emocional da pandemia entre os jovens. Estudos já indicam aumento de quadros ansiosos por causa do isolamento. Para Alexandre Schneider, ex-secretário municipal de Educação de São Paulo e presidente do Instituto Singularidades, a escola “precisa compreender que os estudantes vão voltar de um jeito diferente do que eram”. Disparidades dentro de uma mesma sala tendem a aumentar, o que vai exigir trabalho mais personalizado.
“Mesmo os que conseguiram acessar os materiais não necessariamente tiveram o mesmo aprendizado que se esperaria nas aulas presenciais.” O suporte e as condições financeiras foram diferentes em cada família na quarentena. Antes de avançar nas aprendizagens, diz ele, escolas devem acolher alunos e estreitar os laços com professores.
Essa recepção, segundo Schneider, não pode ser burocrática – pelo contrário, tem de fazer parte do planejamento. “Não é acolhimento de 15 minutos. Isso leva um mês ou mais.” “É preciso compreender que os estudantes vão voltar de um jeito diferente. Mesmo os que conseguiram acessar os materiais não necessariamente tiveram o mesmo aprendizado que se esperaria nas aulas presenciais”, afirma Alexandre Schneider.
Fonte: O Estado de S. Paulo