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Flávio Pereira*

O valor máximo de financiamento foi instituído com o objetivo de aperfeiçoar a gestão orçamentária do Fies, porém a sua metodologia acabou criando distorções e prejudicando principalmente os estudantes de menor renda que, apesar de possuírem um percentual de financiamento normalmente mais elevado, até de 100% no caso do Fies Social, tinham que arcar com o pagamento de um valor mais elevado de coparticipação em cursos com preço mais elevado, como é o caso de Medicina e Engenharias, o que acabava afastando esse público da busca por esses cursos.

Definição e evolução do valor máximo

Implementado a partir de fevereiro de 2016, no valor de R$ 42.983,70, o teto passou por diversas alterações nesse período. A última alteração promovida pelo Comitê Gestor do Fies (CG-Fies) havia ocorrido em junho de 2023, quando o teto de Medicina foi elevado para R$ 60.000,00.

De acordo com Resolução publicada agora no final de julho de 2025, o CG-Fies elevou o teto para o curso de Medicina para R$ 78.000,00, aumento de 30% em relação ao valor anterior, porém manteve o valor para os demais cursos em R$ 42.983,70.

Entretanto, juntamente com o reajuste do valor máximo de financiamento, foi estabelecido o “Compromisso Fies”, que entra em vigor a partir do 1º semestre de 2026. Trata-se de um valor de referência que limitará o valor máximo de encargos educacionais praticados no âmbito do Fies, tanto para efeito do financiamento quanto para cobrança pelas IES.

De acordo com a medida, para os contratos de financiamento firmados a partir do próximo ano, o valor da semestralidade praticado pelas IES no âmbito do Fies não poderá ser superior ao valor semestral máximo fixado pelo Compromisso Fies, o que afeta basicamente os cursos com valor de semestralidade mais elevados, como é o caso da Medicina. De acordo com o MEC, cerca de 15% dos cursos ofertados para Medicina serão alcançados pela limitação, visto que os demais já estariam dentro do novo teto.

Para os cursos com encargos educacionais normalmente inferiores ao valor semestral máximo não há alteração, pois o percentual de financiamento do estudante continuará incidindo sobre o valor praticado pela IES, não incidindo qualquer limitação.

De acordo com André Gustavo, Diretor do FNDE responsável pela gestão do Fies, “O Compromisso FIES representa um avanço importante na gestão do programa, ao alinhar melhor o valor financiado com a realidade dos cursos, preservando a sustentabilidade do Fundo e garantindo mais previsibilidade para todos os envolvidos — estudantes, instituições e governo.”

Impactos do Compromisso Fies

Como os contratos firmados até o 2º semestre de 2025 e seus respectivos aditamentos de renovação semestral não foram alcançados pelos efeitos do Compromisso Fies, não estarão sujeitos à limitação do valor semestral máximo financiado.

Para esses contratos continua vigente o valor máximo de financiamento, de acordo com o que for estabelecido pelo CG-Fies, porém não há limitação do valor máximo cobrado pela IES no âmbito do Fies, cabendo ao estudante arcar normalmente com a diferença entre o valor da semestralidade cobrada e a financiada, se houver.

Já para os contratos firmados a partir do 1º semestre de 2026 e seus respectivos aditamentos de renovação semestral, a IES não poderá praticar no âmbito do Fies valor superior àquele estabelecido pelo Compromisso Fies, mesmo que o valor previsto para o curso seja maior. Nesse aspecto, a legislação do financiamento estudantil já tinha previsão anterior de que o valor de mensalidade para estudantes do Fies poderia ser inferior ao valor dos pagantes.

Como o valor semestral máximo estabelece o teto de semestralidade e de financiamento, os estudantes com percentual de 100% (Fies Social) não terão valor de coobrigação a pagar.

Embora exista previsão de que o valor fixado para o Compromisso Fies será anualmente reajustado, não foi preestabelecido qual será esse índice de correção, nem a época do ano em que será divulgado o novo valor, o que representa um risco para o setor.

A partir de 2026, também entra em vigor a limitação do percentual de reajuste incidente sobre o IPCA, que não poderá ser superior a 100% para os novos contratos. A variação do IPCA já havia sido estabelecida pelo CG-Fies como base para os reajustes anuais após a formalização dos contratos, uma vez que nesse caso não se aplicam as regras de reajuste da Lei nº 9.870, de 1999, porém não havia qualquer limitação do percentual adicional.

Como essas alterações podem afetar o planejamento orçamentário de vários exercícios subsequentes e a política de oferta de vagas para financiamento do Fies, é importante que cada IES avalie os impactos dessas mudanças em suas operações.

Outras medidas anunciadas

Pela primeira vez, o CG-Fies estabeleceu parâmetros para a renegociação de contratos em amortização no âmbito do Novo Fies. Os estudantes com prestações inadimplentes terão até 100% de redução na multa e juros de mora e poderão reescalonar o pagamento em até 180 parcelas mensais.

Ao fixar um prazo determinado para pagamento das prestações renegociadas, o modelo afasta, por ora, o mecanismo de pagamento contingente à renda previsto inicialmente para o Novo Fies que, apesar de ainda não implementado, traria uma combinação mais equilibrada entre prestação e renda do egresso, mitigando o risco de inadimplência.

Essa nova rodada de renegociação, que estará disponível para adesão no período de novembro de 2025 a dezembro de 2026, não se aplica aos contratos firmados até 2017.

A redução da inadimplência no âmbito do Novo Fies é relevante para as IES, pois afeta diretamente o percentual de contribuição em favor do Fundo Garantidor do Fies (FG-Fies). Apesar dessa renegociação se destinar aos egressos, pois alcança somente contratos em amortização, ações para divulgação dessas regras para esse público-alvo pode trazer efeitos positivos para as mantenedoras.

Outra mudança relevante trazida pela Resolução de renegociação se refere à cobrança de parcelas de coobrigação que se encontram inadimplentes em contratos na fase de amortização, que representa uma quebra de paradigma.

Nesse caso, a negociação desse passivo deverá ser realizada diretamente entre as IES e o egresso, de acordo com seu próprio modelo de cobrança, sem qualquer participação do agente operador e do agente financeiro do Fies. Portanto, para esses casos não se aplicam as regras de renegociação da coobrigação prevista nos normativos do Novo Fies para contratos em utilização.

Considerações finais

O Compromisso Fies, embora necessário do ponto de sustentabilidade e previsibilidade do Fundo, impõe desafios significativos para assegurar que o programa continue promovendo acesso e permanência de estudantes de diferentes perfis socioeconômicos em todas as áreas do conhecimento. O ajuste periódico e tempestivo desse teto, alinhado com as políticas educacionais, é fundamental para se manter a atratividade para as IES e segurança para os estudantes beneficiados.

*Flávio Pereira é especialista em Gestão Pública pela Fundace/FEA/USP e Consultor da ANUP. Foi Coordenador-Geral do FIES no FNDE/MEC e membro do grupo técnico do Comitê Gestor do FIES

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