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A crise do coronavírus não trouxe novidades em termos dos desafios à gestão de instituições educacionais, somente aguçou e acelerou tendências que já estavam em desenvolvimento há alguns anos.

Quando escrevo esse artigo, os números de contaminados e de mortos pelo coronavírus ainda não permitem vislumbrar a restauração da normalidade após meses de distanciamento social. Tudo faz crer que a situação socioeconômica vai se agravar mais nos meses subsequentes ao retorno das aulas presenciais, o que pede a adoção de medidas urgentes a partir de uma visão estratégica alinhada com as demandas do futuro que se materializaram no presente, aceleradas em 20 anos pelas mudanças ora experimentadas. Isso deve ser pensado e se transformar em planos de ação, para permitir superar as ondas de choque que se avolumam no horizonte.

O Mapa do Ensino Superior no Brasil 2020 (Semesp, 2020), que se debruça sobre os dados oficiais de 2018, destaca que há uma tendência de concentração do setor. Ao se comparar o aumento das matrículas em relação ao número de Instituições de Ensino Superior (IES), é possível perceber que existe um crescimento mais discreto de IES a partir de 2005, enquanto as matrículas têm aumentado em um ritmo maior. Nos últimos dez anos – de 2009 a 2018 –, as matrículas saltaram 41,2%, enquanto o número de IES cresceu 9,6%.

Ainda de acordo com o Semesp, observa-se a queda do número de estudantes nos cursos presenciais e aumento de estudantes na modalidade a distância (EAD), uma mudança que tem acontecido em virtude, principalmente, de uma troca de alunos em cursos presenciais no turno noturno pela EAD.

Aumentam, a cada ano, as estatísticas dos egressos da educação superior que não conseguem trabalhar na área para a qual se formaram, o que de-monstra um desalinhamento entre os tipos de cursos mais procurados e as demandas da sociedade.

De 2012 a 2018, a proporção de trabalhadores com ensino superior completo avançou de 13,7% para 18,5%. O problema é que boa parte desses trabalhadores com um diploma de graduação nas mãos acaba por exercer funções que requerem um nível de qualificação inferior à sua graduação.

A EAD é responsável por boa parte da expansão recente da educação superior e pode ser considerada o princípio de uma inovação radical ou disruptiva, pois tem causado impacto significativo no segmento. O impacto da modalidade pode, por exemplo, mudar a estrutura do setor, criar novos nichos de atuação ou tornar serviços existentes obsoletos.

Na medida em que as metodologias, tecnologias e outras estratégias associadas à EAD forem incorporadas pelo ensino presencial é também possível verificar a chamada hibridização. A forçosa migração para as aulas a distância gerada pela pandemia promove uma mudança cultural de larga escala que, provavelmente, mudará a atitude de muitos estudantes e professores em relação aos benefícios da EAD.

O país passa por um processo de transição demográfica ou transição vital. Isso traz importantes implicações para indivíduos, famílias e sociedade, além de oportunidades para IES que forem capazes de se posicionar como parceiras para toda a vida na formação de adultos.

Para superar os desafios estruturais que já estavam presentes e os dilemas da pandemia, será necessário definir, com clareza, qual o posicionamento estratégico pretendido, a partir da matriz que orienta as estratégias responsáveis por conduzir ao sucesso ou ao fracasso de uma IES.

É preciso ter clareza se a IES vai se posicionar com base em um ou mais fatores de diferenciação – qualidade, inovação, internacionalização, empregabilidade, rede de contatos, tradição, localização, exclusividade, etc, ou se o preço será seu principal atrativo – custo menor, prazo de pagamento, financiamentos internos e externos, cursos realizados com duração estendida, etc.

Outra fonte de posicionamento competitivo é ter o foco em uma ou outra área de conhecimento, ser a que melhor conhece e prepara para a região onde se localiza ou quaisquer outras fontes de valor agregado que sejam facilmente perceptíveis pelos públicos-alvo definidos.

A pandemia deixa claro que a EAD se tornou uma estratégia obrigatória para todas as IES, seja qual for seu tamanho, localização, tradição ou posicionamento competitivo. Faz-se necessário incluir a EAD nas decisões organizacionais, ainda que sob diferentes possibilidades de escolhas: expansão nacional, expansão regional, defesa da posição local, ensino híbrido para cursos presenciais, participação em consórcios cooperativos, gestão de portfólio de cursos, atendimento a diferentes públicos-alvo ou, simplesmente, para reforçar a oferta exclusivamente presencial, ao agregar valores que a EAD eventualmente não possa suprir.

Dentre as inovações recentes trazidas pela EAD, destacam-se os cursos oferecidos sob a sigla MOOC – Massive Open Online Course (cursos online abertos e massivos).

Massivo é a expressão usada para descrever a capacidade de atender elevado número de participantes, bem como a possiblidade de gerar muitos dados de desempenho dos alunos por meio de recursos da informática.

O conceito aberto pode ser compreendido de formas diferentes. Acesso aberto é quando não há exigências de pré-requisitos, não há necessidade de registros pessoais para acessar o conteúdo, é permitida a participação a qualquer momento e tudo fica acessível mesmo após a conclusão do curso em sua duração determinada.

Online significa estar disponível na Internet para uma ampla variedade de dispositivos, o que facilita a escala e expande o acesso para além do campus tradicional.

Os MOOC prometem trazer abertura à educação superior, ao fornecer acesso flexível e mais cômodo às IES por meio de ofertas gratuitas ou a um custo muito mais baixo para os alunos que estão interessados em aprender. Trazem diferentes modelos de negócios, com possibilidades de receitas financeiras adicionais para as instituições e professores.

Diferenciação intensiva em tecnologia é o conceito-chave para o alinhamento estratégico que ajude a superar a pandemia e seus efeitos nefastos, de forma a ser mais relevante e significativo no contexto no qual a IES se insere.

Referências:

IPEA. A evolução da população ocupada com nível superior no mercado de trabalho. In Carta de conjuntura nº 41, 4º trimestre de 2018. Brasília: IPEA, 2018.

ONU. World Population Prospects: The 2015 Revision. Disponível em <http://goo.gl/UMW-zKz> acesso em 15/12/2015.

SEMESP. Mapa do Ensino Superior no Brasil 2020. São Paulo: Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), 2020.

Acesse o artigo original aqui: Artigo_IES_pandemia_SINEPE_MG_Sathler

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