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No século passado, o modelo de desenvolvimento adotado demandou profissionais que não existiam antes e sofisticou as especializações das profissões que já eram conhecidas. As escolas, seus professores e os métodos foram eficientes e eficazes em atender às demandas do mercado e às expectativas dos cidadãos. Para cada carreira, foram prescritas diretrizes gerais contemplando conteúdos, bem como procedimentos e técnicas a eles associados.

Os percursos educacionais eram simples e funcionavam. Completados os percursos previstos, após avaliações calcadas em testes de memória, em geral respondidos individualmente, os formandos eram agraciados com certificados ou diplomas, os quais atestavam conhecimentos e os habilitavam a migrar para as etapas seguintes ou ao exercício pleno das respectivas ocupações.

Em torno da virada deste século, que também representou a chegada de um novo milênio, as mudanças se aceleraram de forma exponencial, motivadas pelo ingresso no universo digital, deixando rapidamente para trás as realidades analógicas de outrora. O advento das tecnologias digitais impactou, rápida e profundamente, todas as áreas de conhecimento e todos os setores de atividades humanas, incluindo educação. Aquilo que funcionava bem na área da aprendizagem já não funciona mais.

Entender as novas e complexas situações educacionais passa por incorporar a imprevisibilidade, exigindo formar pessoas com capacidade de se adaptarem rapidamente aos inéditos contextos e circunstâncias, sejam eles quais forem. Ficar restrito às receitas já prontas, nos moldes dos tempos passados, tem como consequência limitar os profissionais a trabalhos rasos, subvalorizados e sujeitos a serem, gradativamente, substituídos por máquinas e algoritmos. Os chamados trabalhos profundos, valorizados e compatíveis com o mundo contemporâneo, demandam pessoas capazes de irem muito além de processos memorizáveis, fruto de uma educação que ouse transcender o ensino tradicional, incorporando características que antes eram marginalmente consideradas.

Memória está associada, de forma simplificada, ao conjunto de conteúdos mais tradicionais, tendo papel relevante nos processos cognitivos, especialmente na absorção de conhecimentos básicos, entre eles: 1) letramento geral, capacidade comprovada de escrever e interpretar texto, e o letramento matemático; 2) letramento digital, incluindo o domínio de plataformas, softwares e aplicativos; e 3) capacidade de entender aspectos culturais, artísticos, históricos, geográficos etc.

As habilidades socioemocionais, associadas à metacognição, estão acopladas, principalmente, a aspectos comportamentais, envolvendo a capacidade do educando de refletir sobre a própria aprendizagem. Assim, adicionais ao domínio dos conteúdos, quanto aos aspectos metacognitivos, pretende-se que o educando: 1) seja capaz de aprender a aprender continuamente ao longo da vida, ampliando sua própria consciência acerca dos mecanismos segundo os quais ele aprende; 2) demonstre capacidade analítica para resolver problemas práticos, ou seja, embasado no conhecimento do método científico e na familiaridade com pensamentos críticos, desenvolva o domínio de raciocínios abstratos sofisticados; 3) esteja habituado a juntar diferentes áreas do saber, com especial disposição para a área de gestão de informações, incluindo o domínio de linguagens e de plataformas digitais; 4) tenha efetiva habilidade de comunicação, sabendo lidar com pessoas, incluindo promover mediações com flexibilidade e competência em todos os contextos; 5) tenha inteligência emocional desenvolvida, incluindo perseverança, empatia, autocontrole e capacidade de gestão emocional coletiva; 6) demonstre disposição plena para o cumprimento simultâneo de multitarefas, propiciando capacidade de análises apuradas e de tomada de decisões; e 7) colabore em equipe de forma produtiva, sendo respeitoso e cordial, entendendo as características individuais e as peculiaridades das circunstâncias, promovendo ambientes criativos e empreendedores, resultantes de processos coletivos e cooperativos.

Ambientes virtuais de aprendizagem facilitam a coleta e análise de dados, tantos acerca do domínio de conteúdos como de aspectos comportamentais de cada estudante. Analítica da aprendizagem (“learning analytics”) viabiliza conhecer melhor cada educando e, em conjunto com ele, favorecendo sua própria reflexão sobre o processo de aprendizagem, determinar trilhas educacionais personalizadas.

Em suma, memória e habilidades socioemocionais, tal como cognição e metacognição, não se contrapõem; eles se complementam. O desenvolvimento da habilidade de aprender a aprender só é possível ao longo do processo de absorção de conteúdos. Ainda que, por vezes, seja mais relevante ampliar a consciência de como e em que contexto se aprende do que o que foi efetivamente aprendido. É andando que se desenvolve a capacidade de andar. Até o ponto em que a reflexão madura acerca do próprio caminhar emancipa o educando em direção à aprendizagem independente, preparando-o para toda a vida.

 

Ronaldo Mota – Diretor Científico da Digital Pages, Conselheiro da Associação Nacional das Universidades Particulares/ANUP e membro da Academia Brasileira de Educação

 

 

 

 

 

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